10 junho 2016

Corrida de Obstáculos


A vida de um drogado, é normalmente regulada por ciclos. Seja pelo processo de adquirir dinheiro, gasta-lo na merda, encher a cabeça e outra vez. Pouco muda, se não pelo contexto, será através dos elementos circunstanciais de cada um.
No meu caso tem sido, nesta sinusoide carrocélica, (se é que o termo existe) regida pelas analises semanais no CRi, (anacronismo para Centro de Respostas Integradas) e corrida de obstáculos sociais que me seduzem, a gastar o fruto do meu suado labor a arrumar carros e vender as respectivas senhas de parqueamento, em cavalo, cuja qualidade até é aceitável. Ou seja, saio de casa de manhã e vou tomar a metadona 70cc, e as 11h vou para o parque laborar até as 13h, troco as moedas por dinheiro papel e por entre indecisões e falsas partidas, entrego o máximo de dinheiro possível a minha mãe, que comigo está em todo o processo.
A titulo de exemplo, no passado dia 9, recebi no parque onde me encontrava uma visita de um antigo dealer, que me questionava a minha ausência de contacto da minha parte, dado que nos últimos  anos lhe havia ligado quase diariamente para adquirir Heroína, e que há já 1 mês que não acontecia pois a qualidade havia decrescido muito, e cujo o curto dialogo, aqui tentarei transcrever:
- Atão mano, nunca mais ligaste ao amigo?- inquiriu acompanhado no carro com um familiar.
- Eh pá!, bons olhos o vejam amigo.. sabes que me ando a portar bem..- retorqui.
- Mano, agora tenho aí uma 'papeletas' bem aviadas e uma cena de boa qualidade!
- Pois.. Mas não tem dado jeito ligar-te!
- Mas isso não interessa Mano, -insistiu- liga-me mais logo que eu avio-te bem!
- Ook..- balbuciei- saio daqui a 1 horita já te dou um toque!
Ao sair do parque com 46 euros ainda considerei ligar ao dealer, tinha saldo no mobil suficiente para uma chamada, mas caguei.. a caminho de casa vejo um outro conhecido dealer no jardim, e que por linguagem gestual e nuns curtos acenos de cabeça e dedos, compreendi que tinha em sua posse alguma Heroína. Montado na bicicleta ainda me dirigi em sua direção, mas 3 pedaladas depois voltei a mudar de direção acenando -lhe que não, e segui contente a minha vida rumo a casa da minha mãe.. Fiz um desvio em direção a um sitio onde normalmente me encontro com o meu dealer do momento, dentro do centro histórico da cidade,
 E LIGUEI FEITO PATEGO..
- Tou sim equipa, tou aqui no sitio do costume! -assim que atenderam, foi o que eu disse.
- Quem fala?- perguntaram.
- Sou eu Paulinho tou aqui e agora!- repeti me.
- Eh pá agora não estou por aí, mas vou pedir um carro emprestado vou ja aí ter contigo!
FEZ-SE LUZ NA MINHA CABEÇA
- Olha caga nisso, deixa-la obrigado na mesma!- disse eu-
- De certeza? Nao demoro!- ainda..-
- Mesmo! Obrigadíssimo fica para depois!- vitorioso desliguei o telemóvel.
E FINALMENTE CHEGUEI A CASA DE MINHA MAMA.
Contei o sucessivo e como se parecia com uma corrida de obstáculos que com mais ou menos dificuldade havia conseguido ultrapassar.
Dos 46 euros entreguei 40 comprei tabaco de onça, tubos para os mesmos e ainda sobrou 1 eurito para apostar em jogos do placard.

A capacidade de dizer NÃO, é do mais importante que há nesta e noutra qualquer fase da vida.
Deve ser isto o é ser Heroi para Heroína.

Paulinho a.k.a. Paulo Gomes

dr. Paulo de Jesus
presidente do CRi